sexta-feira, 16 de outubro de 2009



Ter fé é também obedecer

“Fé e fidelidade não são apenas termos etimologicamente próximos. Seus conceitos na Palavra caminham de mãos dadas”

A Epístola aos Hebreus é um dos livros mais fascinantes de toda a Bíblia. Ela nos leva a crer que a missão da Igreja está fundamentada em Cristo. Este livro, fortemente cristocêntrico, apresenta Jesus logo no primeiro capítulo como o resplendor da glória, o herdeiro de todas as coisas, sustentador do universo, purificador de pecados, majestoso e superior aos anjos. O livro se inicia com dois versos mostrando que Deus havia outrora falado e que hoje o faz através do seu Filho, Jesus Cristo, expondo que a fé cristã não é apenas um aglomerado de informações históricas – ao contrário, ela é para os dias de hoje, um legado para nosso tempo.

Um dos principais temas do livro de Hebreus é a fé. Enquanto a fé crê no invisível, a superstição acredita no inexistente. No capítulo 11, encontramos a galeria dos heróis da fé, aqueles que traduziram o conhecimento de Deus para a vida com Deus. Se estamos sem direção, somos lembrados de que Abraão saiu de sua terra sem nem ao menos saber para onde ia, mas na dependência de Deus seguiu para a Terra Prometida. Se estamos no fim da vida, nos lembramos de Jacó, que terminou seus dias prostrado em seu cajado, adorando ao Senhor. Já se sentimos o peso da responsabilidade sobre nós, vemos Moisés conduzindo uma nação inteira durante 40 anos de peregrinação por um deserto. Caso soframos discriminação, vemos que Raabe, uma prostituta, foi escolhida por Deus para ser da linhagem de Davi. Sim, a fé é transformadora e consoladora, fundamentada em um Deus que controla o incontrolável.

O texto aos hebreus afirma que eles creram, e portanto, obedeceram. Assim, seu conteúdo nos apresenta uma fé não utilitária e fundamentada nos desejos humanos, mas sim obediente, fundamentada nos desejos de Deus. Não é manipulada pelo homem, mas sim um instrumento para que o homem seja usado por Deus. Desta forma, o autor da Carta aos Hebreus nos fala que pela fé ruíram as muralhas de Jericó, reinos foram subjugados, promessas foram cumpridas, mortos ressuscitaram e até bocas de leões famintos foram fechadas. Esta fé nos ensina que o impossível pode, a qualquer momento, acontecer, se o Senhor assim desejar.

Há, porém, o outro lado das ações fundamentadas na fé, pois o livro nos diz que estes que creram, possuidores de fé, foram torturados, passaram pela prova de açoites, foram apedrejados, provados, serrados pelo meio, mortos ao fio da espada, andaram peregrinos. É a fé que nos prepara para continuar crendo, mesmo no vale da sombra da morte – uma fé que não apenas produz resultados, mas prepara o cristão para passar pelo vale do sofrimento sem deixar de crer no Senhor.

Hebreus nos diz também que somos estrangeiros e peregrinos. Isso se refere àqueles que estão de passagem pela terra e nos lembra de que não é aqui que devemos guardar nossos mais preciosos investimentos. Afinal, os bens desta terra são transitórios, e a eternidade nos aguarda. Ajuntemos, pois, tesouros nos céus. Fé e fidelidade não são apenas termos etimologicamente próximos. Seus conceitos na Palavra caminham de mãos dadas. Devemos, portanto, crer para a fidelidade e não apenas para nosso contentamento. Abraão, que creu, saiu de sua terra sem saber para onde ir; simplesmente, obedeceu. Uma igreja que crê é uma igreja que sai para mostrar Jesus ao mundo, que nega a si mesma, a seus interesses e tesouros transitórios para investir na eternidade; uma comunidade de fé que não deseja ser honrada na terra, mas sim, ser sal da terra. Crer é confiar, mas não apenas isto. É também permanecer no caminho e obedecer.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

terça-feira, 25 de agosto de 2009

Jesus não é uma MARCA


A evangelização na era do consumo tem muito do discurso do marketing – mas a Igreja não pode oferecer o Evangelho como bem de consumo

A marca Jesus é uma das mais conhecidas e rentáveis do mundo. O nome do Filho de Deus acompanha a humanidade há dois milênios, resistiu a toda sorte de crises – da opressão romana no início da Era Cristã ao comunismo, das trevas da Idade Média ao ateísmo filosófico do século 19 – e é a razão da fé de pelo menos 2 bilhões de pessoas. Seus ensinos e as frases que disse em seu ministério terreno – como o genial “Dai a César o que é de César” ou o inquietante “Quem não tiver pecado que atire a primeira pedra” – fazem parte dos mais diversos cases de marketing.

Mas são justamente as estratégias empregadas na propagação do Evangelho que têm causado mais controvérsia. Esta é a questão que se levanta quando pesamos os métodos de evangelismo público por parte de igrejas marcadas pela cultura ocidental, saturadas pelo marketing.

Ora, qualquer secundarista sabe que marketing pode ser definido como todas as atividades que ajudam empreendedores a identificar e moldar o desejo de seu alvo, os consumidores – e, então, satisfaze-los mais do que seus competidores o fazem. Isso geralmente envolve pesquisas de mercado, análise das necessidades do cliente, e, então, decisões estratégicas sobre design de produtos, preços, promoções, propaganda e distribuição.

A Igreja enfrentou – e enfrenta – questões inevitáveis por escolher manter o evangelismo pessoal e testemunho público em uma sociedade marcada por uma cultura consumista. A primeira questão é: Será que devemos transformar em artigo de mercado a Igreja e a mensagem de Cristo? Podemos usar técnicas de marketing no cumprimento do “Ide” de Jesus?

Temos condições de mudar o meio sem afetar a mensagem? Ou será que o próprio meio do marketing mancha nossa pregação, fazendo-nos resistir até o último suspiro a toda acomodação à nossa cultura de consumo?

Parece evidente que, a menos que nos abstenhamos de toda forma de evangelismo, o marketing é inevitável. Se ele é a linguagem da nossa cultura, os cristãos devem ter fluência nele, da mesma forma que os missionários transculturais precisam dominar o idioma dos povos aonde vão atuar.

O marketing é apenas a última encarnação dos clássicos modelos evangelísticos, como a persuasão e o exemplo de vida. Por esta perspectiva, o erro estaria em fazer um marketing da Igreja de forma pobre, o que a faria parecer menos do que ela é – como uma marca indesejável – para um público de não cristãos. Deve-se ter em mente, também, que o marketing tem um problema: às vezes, ele leva as pessoas a fazer exatamente o oposto do desejado.

Conflitos com a vida cristã – Em outros termos, as pessoas que respondem ao marketing eclesiástico encaram Jesus como uma mercadoria. Este é o primeiro e grande problema, pois isso é blasfêmia: nós estamos falando sobre o Logos encarnado, e não sobre uma logo. Por outro lado (caso blasfêmia não seja o suficiente…), isso deveria nos preocupar pelo problema que traz para o discipulado. O consumismo não é apenas um fenômeno social – é espiritual. Ele vem dos hábitos e comportamentos espirituais que conflitam com as práticas particulares da vida cristã.

Existem vários conflitos desta natureza, mas quatro se destacam como mais arriscados:

1. “Você é o que você compra” versus senhorio de Cristo – Em uma sociedade consumista, a identidade das pessoas vem do elas consomem. O principal foco de uma sociedade consumista é o consumidor – o que é essencial. Marcas comerciais não fazem nada para abalar essa auto-suficiência fundamental; na verdade, elas dependem disso. A dinâmica é simples – nós pagamos pelo privilégio de algumas marcas porque gostamos do que elas fazem por nós. Em contrapartida, as marcas estão bastante satisfeitas em receber nosso dinheiro. Consumidores espirituais, portanto, haverão de se aproximar da Igreja com o mesmo narcisismo com o qual se aproximam das demais marcas, com questionamentos como: “O que estou expressando a meu respeito, caso eu compre a marca Jesus?”; ou “Como o cristianismo completará a visão que eu tenho de mim mesmo?”.

A implicação teológica disso é: eu pertenço a mim mesmo. Sou meu próprio projeto, meu próprio produto. Essa é uma terrível rejeição à glória que deve ser dada a Deus como Criador. O perigo está no fato de que a Igreja passa, com isso, a transformar rapidamente o Evangelho em mera ferramenta de preenchimento pessoal. Pregações e evangelismo que enfatizam apenas os benefícios de se tornar um crente apresentam uma mensagem não muito diferente das propagandas que falam sobre as vantagens de determinados modelos de carros, por exemplo. Essa atitude prejudica o crescimento dos discípulos rumo a uma vida centrada em Deus e no próximo. Sim, a vida cristã traz plenitude para além da imaginação; mas ela vem apenas quando buscamos a Deus mais do que a nós mesmos. Aqueles que vêm à igreja esperando satisfações de mercado e procurando apenas salvar sua vida não encontrarão nem uma coisa nem outra.

2. Descontentamento versus a suficiência de Cristo – Embora o consumismo prometa plenitude pessoal, os ciclos econômicos dependem inteiramente de um descontentamento contínuo. No fundo, o consumismo não se trata apenas de comprar um produto novo, mas sim, de adquirir esse produto para que você se sinta novo. As pessoas que trabalham com o marketing sabem disso e planejam seus produtos de tal forma que o consumidor sempre é levado a desejar o novo que está por vir, o último modelo do que já tem.

Consumidores descontentes também carregam uma armadilha espiritual semelhante. Inicialmente, nossa busca perpétua por conforto e felicidade, na verdade, aniquila-se toda chance de satisfação de nossos desejos.

O prazer de comprar um novo produto ou serviço, na verdade, durará pouco tempo. Logo vai embora – e o pior é que imediatamente depois, passamos a desejar algo novo. Em seguida – e esta é uma questão perversa –, nós não conseguimos lidar com desconforto.

Como consumidores, buscamos novos produtos quando percebemos os primeiros sinais de irritação. Como as clinicamente identificáveis dependências de compras, esse é um espantoso indicador de uma cultura decadente.

A maioria das pessoas, nos mais diversos lugares, não tem o luxo de lutar por vidas livres do sofrimento e da dor. Evidentemente, termos todas as nossas necessidades sempre supridas é precisamente o oposto do que o discípulo deve experimentar. Paulo mostra uma indiferença quanto às circunstâncias da própria vida, sentimento que era fruto de sua maturidade espiritual: “Aprendi a viver contente em toda e qualquer situação.

Tanto sei estar humilhado como também ser honrado; de tudo e em todas as circunstâncias, já tenho experiência, tanto de fartura como de fome; assim de abundância como de escassez. Tudo posso naquele que me fortalece” (Filipenses 4.11-13).

A questão levantada pelo apóstolo não é que veremos todas as nossas necessidades prontamente assistidas, mas que, fazendo de Jesus o Senhor de fato de nossas vidas, precisaremos cada vez de menos coisas para termos satisfação completa. O discipulado, presente na comunidade cristã, tem como objetivo satisfazer com uma só coisa: o senhorio de Cristo em sua vida.

3. O relativismo das marcas versus o senhorio de Cristo – Um bom profissional do marketing busca formar um tipo de pessoa que se identifica tanto com sua marca que passa a considerar algo inimaginável a possibilidade de viver sem ela. Em se tratando de valores, esse tipo de entusiasmo parece indicar uma superioridade das marcas na vida de alguém.

Entretanto, subjacente a esse fanatismo pelas marcas, está o relativismo inerente no consumismo. Uma marca de celular não é inerentemente melhor do que a concorrente, embora produtos do gênero precisem ter certa dose de competição técnica. Uma delas pode até fazer um melhor trabalho de capturar as mentes e os corações; todavia, dizer que determinado logo é melhor do que outro é tão ridículo quanto afirmar que os moradores de Boston são melhores do que os moradores de Chicago.

Melhores por quais padrões? Para ser honesto, as marcas comunicam coisas diferentes umas das outras. No mercado americano de automóveis, Mercedes representa luxo, enquanto Honda expressa confiança. Ambas, porém, fazem o que devem fazer em termos de qualidade.

Portanto, a superioridade de uma sobre a outra está única e exclusivamente na cabeça do consumidor.

O consumidor que compra nosso marketing fará de Jesus sua marca escolhida, e o zelo resultante dessa escolha parecerá fé apaixonada. Aparências nos desapontam. Uma fé genuinamente apaixonada está enraizada em quem Cristo de fato é. Um zelo pela marca, por sua vez, está centrado na própria pessoa, pois a superioridade de uma marca sobre a outra depende tão somente do entusiasmo do seu devoto.

O zelo existente mascara a arbitrariedade da escolha. Entretanto, a escolha por Cristo não é arbitrária. Se um consumidor descontente com uma marca de TV escolhe outra, a primeira perde e a segunda ganha. Mas se uma pessoa deixa de escolher a Cristo para servir a outros deuses – ou a deus algum –, Cristo não é nem um pouco diminuído.
Consumidores espirituais não têm porque achar que o cristianismo não é uma opção entre muitas. Entretanto, a santidade na vida de uma igreja é um grande testemunho do contrário.

A igreja revela a supremacia de Cristo em um mundo que nega seu poder quando ama o que não é amado, perdoa o imperdoável, promove reconciliações aparentemente impossíveis e faz a perseverança triunfar sobre as dificuldades.

4. Fragmentação versus unidade de Cristo – A chave para o sucesso no marketing é a segmentação: dividir determinada população em grupos identificáveis por suas preferências relacionadas ao consumo. Trata-se de uma análise demográfica. Um profissional do marketing pode olhar para as contas mensais de uma pessoa, ou apenas para o CEP de seu endereço e descobrir coisas importantes para acerca de seu perfil de consumo.

As segmentações nos chamados nichos de mercado permitem aos marqueteiros concentrar suas mensagens em públicos mais restritos, tornando-as mais eficazes. Isso tem permitido que o ser humano do século 21 com capacidade de consumo possa viver praticamente alocado dentro de suas preferências.

Vivemos em bairros residenciais com pessoas que se parecem conosco, vamos a igrejas cujos membros têm perfil social semelhante ao nosso, passeamos com companheiros que têm os mesmos gostos que nós. Tudo isso contribui para relutarmos contra a vida em contextos nos quais as pessoas não são como nós.

Isso, é claro, é um problema para a Igreja. A unidade cristã é um valor bíblico inegociável. Pense na oração de Jesus em João 17, na exortação de Paulo aos filipenses para que fossem um com a mente de Cristo, ou na metáfora da Igreja como o corpo de Cristo, com diferentes membros igualmente importantes em suas funções.

Como Paulo afirmou em Gálatas 3.28, a unidade de Cristo rompeu todas as principais diferenças da sociedade romana: de tribo, classe e gênero. Com efeito, nenhuma identidade importa tanto quanto a identidade cristã.

Precisamos, portanto, estar atentos para as infiltrações da segmentação do marketing nas nossas igrejas. Isso tem provocado duas inaceitáveis consequências: igrejas extremamente homogêneas representando tendências consumistas e, na outra ponta, pequenos grupos homogêneos dentro de grandes igrejas.

Ambas as tendências tendem a nos separar dos que nos parecem “diferentes” e a nos levar uma comunhão restrita por padrões sociais, culturais, etários ou até mesmo étnicos – ou seja, caímos no nicho eclesiástico. Certamente foi a isso que Paulo referiu-se como “conformação com este século”, citada em Romanos 12.2.

O consumismo veio para ficar. Hábitos como autocriação, descontentamento, relativismo e fragmentação se tornarão mais dominantes nos próximos anos. Essa é a forma que a economia global e as transações comerciais julgam ser interessante.

Não podemos derrotar nossa realidade; podemos, sim, viver de forma fiel em meio a esse contexto. Para isso, é fundamental nos lembrarmos da natureza da Igreja de Cristo. Em todas as épocas, cristãos têm lutado para defini-la; é uma tarefa difícil porque é a única instituição divina e humana ao mesmo tempo.

A Igreja é como uma família, um reino, uma organização social, uma reduto de vida, de companheirismo e – para os nossos dias – um mercado. O problema se instaura quando procuramos definir a Igreja como um todo a partir de apenas um de seus aspectos. Ou seja, tratando-a como um mercado que tem uma marca a ser vendida. Se tratarmos o Evangelho como um produto, não estaremos levando aqueles que não crêem a pensar na cruz como apenas mais um logo?

Nós também precisamos entender, porém, que, não importa o que façamos, o consumismo inevitavelmente estará presente na forma pela qual as pessoas veem a Igreja em nossa sociedade. Toda nossa comunicação da Palavra de Deus será encarada como um marketing; toda exposição dos conteúdos do Evangelho será tida como um produto.

E o evangelismo será vist como uma venda. Nada há que possamos fazer para mudar esse contexto. Há ainda mais razões para desafiarmos as expectativas. Consumidores espirituais virão às nossas igrejas como vão às vitrines das lojas nos shoppings, procurando um produto que combine com suas preferências.

Eles desejarão isso porque consumir é a única salvação que eles conhecem. Trarão todos os seus recursos e terão grande dificuldade em entender a graça de Deus, porque não conseguem conceber algo que não pode ser comprado.

Eles virão à nossa vitrine buscando o que querem, da mesma forma como fizeram aqueles que foram a Jesus, em seus dias, buscando comprar seus produtos – os milagres que operava. Naquela época, eles estavam procurando por um mestre, um homem louco, um profeta ou revolucionário, e – no fim – por um cadáver. Hoje, eles estão buscando uma marca espiritual.

Nos dias de Jesus na Terra, quem o procurou encontrou um Messias vivo e um Senhor. Eles encontraram o Deus pelo qual nem mesmo estavam procurando. A pergunta que nos cabe, hoje, é se aqueles que o buscam hoje haverão de achá-lo no que se chama de corpo de Cristo, chamado para transformar o mundo – e se, procurando algo novo para comprar, serão surpreendidos por Deus.

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

BRÁULIA RIBEIRO: ENTREVISTA


BRÁULIA RIBEIRO: ENTREVISTA

http://www.cristianismohoje.com.br/

Desde 2005, a agência missionária Jovens com Uma Missão, a Jocum, encontra-se no olho do furacão. Naquele ano, dois obreiros ligado à entidade, o casal Edson e Márcia Suzuki, que atuavam havia longo tempo junto à etnia indígena suruwahá, salvaram uma criança condenada à morte pela própria tribo. Nascida com hipotireoidismo, Hakani, a criança, deveria ser sacrificada – o costume do infanticídio ainda é comum entre diversas nações indígenas brasileiras. A atitude, tomada em comum acordo com parentes da criança, fez o mundo desabar sobre a cabeça dos missionários. Acusados pela Fundação Nacional do Índio, a Funai (órgão ligado ao Ministério da Justiça que executa a política indigenista nacional), pelo Ministério Público e por setores acadêmicos de “crime cultural”, os missionários, bem como outros obreiros da Jocum, foram obrigados a deixar as áreas indígenas. Em maio deste ano, outro ataque – um diretor da Funai, Antenor Vaz, divulgou um dossiê contendo pesadas críticas à ação das missões religiosas que trabalham com indígenas em geral e à Jocum em particular.
A missionária Bráulia Ribeiro, presidente da missão entre 2003 e 2007, acompanhou de perto todo o processo contra a entidade. Ela atuou durante quase duas décadas entre os suruwahá, conhecendo como ninguém sua rotina, língua e cultura. Legitimada por tanta experiência, ela fica indignada com a situação. “Existe uma indisposição geral contra as missões indígenas. Trata-se de uma suspeita gratuita, porque há algo de inaceitável para o governo na nossa própria existência”, reclama. Bráulia considera que o relatório da Funai está eivado de erros e preconceitos – “Foi elaborado sem qualquer apuro acadêmico”, denuncia – e que falar em respeito a culturas indígenas diante de ameaças à vida dos próprios índios é um absurdo. “O mito da tolerância cultural absoluta nos tirou a capacidade de perceber os seres humanos por trás da coletividade indígena”. Bráulia é uma das principais vozes na luta contra a prática do infanticídio, que segundo ela, já é combatida pelos próprios índios. “A garantia à vida é direito constitucional”, lembra.
A missionária faz questão de desfazer o que chama de mentiras, como a noção de que a fé cristã descaracteriza o modo de ser do índio. Segundo ela, todas as culturas nativas têm a figura de uma divindade criadora – neste contexto, a noção de um Deus Todo-poderoso seria, em sua opinião, perfeitamente cabível. “Além disso, a moral cristã se parece mais com a vida tribal, que na maioria das vezes tem o núcleo familiar forte e bem apoiado por sanções sociais, do que a amoralidade permissiva que alguns pesquisadores preconizam”, aponta. Bráulia não tem dúvida – o índio cristão é cem por cento índio. Ela conversou com o portal CRISTIANISMO HOJE:

CRISTIANISMO HOJE – Na sua opinião, por que a Funai tem imposto tantas restrições à ação missionária evangélica nas áreas indígenas?

BRÁULIA RIBEIRO – Existe uma indisposição geral contra as missões indígenas.Para mim, trata-se de uma suspeita gratuita, porque há algo de inaceitável para o governo na nossa própria existência. A mentira em que se acredita é que as missões são as únicas instituições que mudam o estilo de vida dos indígenas, ferindo-os diretamente em sua cosmovisão. A sociedade em geral tende a acreditar nisso por desconhecer a realidade sócio-cultural das nações indígenas. Na verdade, todos que têm contato com os povos indígenas mudam sua cosmovisão, porque não existe cultura humana estática. Ora, todos os grupos humanos sofrem constantes mudanças em sua maneira de ver e se relacionar com o mundo. A Funai, entre todos os grupos, é o que mais tem contato permanente com povos indígenas – então, seria a maior causadora de mudança de sua cosmovisão.

Quais foram os desdobramentos das críticas do relatório do sertanista Antenor Vaz?

Até agora, estamos ainda sendo investigados e oficialmente proibidos de manter uma equipe na área suruwahá . A Jocum, na maioria de seus projetos, usa o método missiológico C5. Nesta abordagem missionária, não se prega religião ou se impõe qualquer noção ocidental de organização da revelação de Deus. Deus se manifesta e se revela à cultura, e hábitos culturais e formas religiosas são mantidos – a não ser que os próprios índios os definam como conflitantes com a revelação que receberam. No caso dos suruwahá, a valorização da vida foi o efeito mais sentido diretamente. Teve como conseqüência o próprio confronto dos índios com o governo para salvar seus filhos que anteriormente seriam destinados ao infanticídio. Foi exatamente esta mudança cultural que colocou a Jocum no centro deste conflito que perdura até hoje. Foram os próprios índios, implorando por ajuda para salvar seus filhos, que nos levaram a isto. O dossiê pseudo-acadêmico de Antenor Vaz diz que a Jocum cometeu todos os crimes, pecados e erros e possíveis como missão. Pense em uma acusação qualquer que se faz contra ONGs na Amazônia. Pois esta acusação provavelmente está no dossiê, usada contra nós. É uma tentativa desesperada de nos achar em alguma falta.

Mas a Jocum não cometeu nenhum equívoco que justificasse a pressão que tem recebido da Funai, do governo e de setores acadêmicos?

Dos setores acadêmicos, não. Não existe nenhum rigor acadêmico no que foi feito. Pelo contrário – se houvesse, teríamos que ser reconhecidos como lingüistas que classificamos, descrevemos, analisamos e apresentamos para o mundo científico a língua suruwahá e a cultura de seu povo. Este trabalho já valeu aos nossos lingüistas publicações nacionais e internacionais, teses de mestrado defendidas na Unicamp e na Unir. Márcia Suzuki, da ONG Atini, recebeu até uma proposta para doutoramento na Universidade Paris X, uma das melhores universidades européias na área. Se cometemos algum erro, foi o de manter a nossa comunicação com o mundo externo cifrada em crentês por muitos anos, não denunciando com mais eficiência os abusos cometidos pela Funai – e o de não militar com eficiência e ardor pelo respeito governamental aos direitos humanos dos povos indígenas.

Setores da Funai acusam a Jocum de agir a serviço de interesses estrangeiros. Tendo sido a agência fundada por um missionário americano, o que existe de verdade e de mentira nesta acusação?

Apesar de termos fundadores americanos, a Jocum é a mais – ou uma das mais – brasileira das missões do país. Está no próprio “DNA” da missão a capacidade de se metamorfosear de acordo com o ambiente onde atua. A Jocum Brasil nasceu popular, povão mesmo, na década de 1970, dando espaço para que os jovens vindos das classes C e D participassem e liderassem nosso movimento de missões. Eram jovens que, até então, não tinham acesso aos cursos missionários mais tradicionais, que geralmente custavam caro. Por sermos um movimento basicamente leigo, tivemos muita liberdade para desenvolver nossa própria missiologia, uma missiologia brasileira. Eu me lembro de quando comecei na Jocum. Nossa equipe não tinha dinheiro para fazer compras na cidade, então ficávamos nas aldeias e vivíamos como índios, caçando, pescando e plantando como eles. Mais tarde, vim a saber que este estilo de fazer missões era chamado de encarnacional pelos especialistas. E descobrimos que isso nos aproximava das pessoas, nos dava uma capacidade de entender melhor a cultura junto à qual atuávamos e de sermos entendidos pelos indivíduos daquela cultura de maneira muito mais intensa do que se vivêssemos isolados em nossa própria estrutura missionária. Em meu livro Chamado radical, publicado pela Editora Ultimato, conto a história do nascimento de nosso trabalho com crianças de rua em Belém, ribeirinhos e do trabalho indígena. Na Jocum, temos espaço para o sonho e a iniciativa individuais. Não temos um pacote pronto institucional de alvos e interesses organizacionais. Não temos dinheiro centralizado, e cada projeto tem que se auto-financiar. Cremos que o jovem romântico de mochila nas costas é quem vai nos mostrar o próximo passo a dar. Acho que é por isso que a Jocum se mantém, com quase 50 anos de existência, como a missão que ainda mais cresce no mundo.

O que a senhora tem a dizer acerca da abordagem antropológica que considera o infanticídio como mera prática ritual?

O mito da tolerância cultural absoluta nos tirou a capacidade de perceber os seres humanos por trás da coletividade, ou da cultura indígena. A Jocum, em 2005, comprou uma briga com o governo ao retirar de uma tribo indígena considerada isolada uma garota para tratamento médico, que nasceu com defeito genético. Para os antropólogos do Ministério Público envolvidos, no caso somos culpados do crime de interferência cultural. Para eles, claramente, a vida da menina não tinha valor singular ou inerente – o costume cultural do infanticídio era o único valor a ser preservado. O que eles queriam, na verdade, não é a preservação da cultura, porque até a pessoa mais ignorante sabe que sem pessoas, sem indivíduos que a vivam, não existe cultura; portanto, a preservação das pessoas tem que vir antes da abstração da cultura. Mas o que eles queriam é a manutenção do darwinismo social mal-disfarçado que permeia o indigenismo brasileiro. Este é hoje o conceito prevalente no meio indigenista. Como erro curioso na cadeia evolucionista, estas culturas “primitivas” devem ser preservadas ao preço até da vida dos indivíduos que as compõem. Não por elas, mas pelo “serviço” que elas prestam à ciência ocidental, como propôs o próprio Napoleon Chagnon, durante sua carreira de antropólogo entre os yanomami.

Quem mais, além da Jocum, levanta a bandeira contra o infanticídio?

Hoje, o movimento contra o infanticídio vai muito além da Jocum ou das missões cristãs – e não se trata de uma questão religiosa, apesar de que, maliciosamente, alguns querem tratá-la assim. Trata-se de direitos constitucionais e fundamentais, que são negados aos povos indígenas por causa da miopia do darwinismo social. Com o nascimento de ONGs importantes como a Atini – Voz pela Vida e o Movimento Indígena contra o Infanticídio, o debate ganhou corpo nacional. Povos indígenas do Oiapoque ao Chuí, falantes diferentes línguas e com diferentes cosmovisões, insistem com o governo pelo direito à assistência médica eficiente para suas crianças. Exames clínicos básicos e obrigatórios para a população brasileira em geral, como o teste do pezinho – que pode diagnosticar doenças precocemente, permitindo seu correto tratamento –, não são feitos até hoje nas nações indígenas. Abandonar essas crianças é condena-las a morrer.

A repercussão do filme Hakani beneficiou de alguma forma a ação da Jocum contra a prática do infanticídio indígena?

Nós ajudamos na produção do filme, mas os povos indígenas representados por várias associações que hoje representam esta voz contra o infanticídio é que são os protagonistas do movimento. E claro – sendo nosso mundo tão audiovisual, o filme deu uma tremenda força à causa, tanto dentro das comunidades indígenas como fora. O filme narra a história real de uma garotinha indígena salva do infanticídio por seu próprio irmão. O documentário-drama foi realizado com a participação voluntária de integrantes de 16 nações indígenas. Hakani de maneira nenhuma difama ou diminui os povos indígenas, mas mostra como, de maneira altruísta e nobre, muitos índios se levantam para acabar com um costume cruel que só subsiste até hoje por causa da indiferença do Estado e das falácias que dão aos indígenas um status não-humano a nosso olhos brasileiros.

Qual é a posição da agência diante da atual política adotada pelo governo em relação aos índios isolados, que é a de impedir qualquer contato com os brancos?

Nós não somos uma missão integracionista, ou seja, que trabalha com integração cultural das tribos à cultura nacional. Pelo contrário – até representamos uma missiologia ainda muito pouco conhecida e aplicada no Brasil, e que separa claramente a ocidentalização, ou aculturação, da mensagem supracultural de Jesus. Durante nossos vinte e quatro anos de contato com os suruwahá, não introduzimos nenhum hábito material novo. Eles continuam vivendo como sempre viveram, autônomos e independentes da sociedade envolvente. Se compararmos a situação dos suruwahá no contato pela Funai na mesma época, perceberemos uma diferença enorme. Enquanto os suruwahá mantém sua dignidade auto-estima, autonomia e têm o mesmo número de habitantes de 30 anos atrás, os urueu-wauwau de Rondônia, por exemplo, vivem na dependência material das bolsas assistenciais do governo, atormentados pelo alcoolismo e desestruturados socialmente. Esse povo perdeu sessenta por cento de sua população no mesmo período de 30 anos. No entanto, apesar de manter a autonomia sócio-econômica, os povos semi-isolados precisam de um trabalho de educação e de pontes com o mundo externo. Eles têm que se preparar para o confronto inevitável, têm que entender nosso mundo e saber que podem se relacionar de igual para igual com ele. A Amazônia é enorme e a vigilância constante naquela região é muito difícil, ou mesmo impossível. Eles têm que também receber assistência de saúde boa e completa, de preferência que inclua também o treinamento de agentes de saúde indígenas, a fim de que as ações sejam continuadas, e não esporádicas, dependendo apenas da visita de médicos a cada seis meses. Esta história que a medicina tradicional dá conta do recado é puro descaso. Se abandonados à sua própria sorte, estes grupos vão acabar desaparecendo.

Além do trabalho religioso propriamente dito, quais são as outras atividades dos obreiros da Jocum em áreas indígenas?

Entenda que o trabalho considerado “religioso” só acontece em populações aculturadas e a pedido destas mesmas populações. Eu tentei explicar isto numa reportagem de TV e minhas palavras foram mal-compreendidas e distorcidas como se eu tivesse intenção de negar a fé. Um missionário da Jocum em área indígena – e acredito que de outras missões também – se ocupa mais em tarefas diárias relacionadas à sobrevivência destes povos do que com tarefas religiosas. Não existe, pelo menos de nossa parte, uma “catequese” sistemática. Tudo acontece no contexto de relacionamento. A cosmovisão cristã está muito mais próxima da cultura indígena do que a cosmovisão secular liberal, o cientificismo cético que praticam os indigenistas não-cristãos. Enquanto o secularismo nega a existência de um mundo sobrenatural e atribui tudo à mitologia e ao folclore indígena, o cristão crê na sobrenaturalidade que permeia o dia a dia indígena e participa desta realidade com suas orações, amizades e crença no Criador, no “Espírito do Bem”, que é Jesus. Isto é, não forçamos nada aos índios; simplesmente vivemos uma vida de dedicação, amizade e compromisso com o bem-estar social da aldeia.

Mas e a questão da moral cristã? Ela pode ser seguida numa tribo indígena?

Olha, a moral cristã também se parece mais com a vida tribal, que na maioria das vezes tem o núcleo familiar forte e bem apoiado por sanções sociais, do que a amoralidade permissiva que alguns pesquisadores retrataram erradamente. Alguns missionários fazem a tradução do Novo Testamento, sim. Mas fazem também a tradução de lendas e mitos da cultura indígena. A própria tarefa de tradução da Bíblia obriga o missionário a um conhecimento real e um respeito pela língua e cultura indígenas maior do que o de um antropólogo que passa dois ou três meses numa tribo ajudado por tradutores quase sempre ruins. O resultado disso é uma dissertação na maioria das vezes planejada para provar uma tese científica qualquer já pré-estabelecida.

E até onde o conteúdo da Bíblia, escrita no contexto judaico-cristão da Antigüidade, tem algo a ver com a realidade do indígena?

Quando, nas aldeias mais aculturadas, acontece o ensino bíblico sistemático, este ensino é mais um em meio a tantos outros ensinos necessários para a sobrevivência do povo – e, ao invés de diminuir a auto-estima e força cultural daquela comunidade, faz com que eles tenham mais orgulho de quem são, e portanto vontade de manter sua organização social e familiar. A Bíblia é basicamente a história de um povo tribal lutando para sobreviver em meio a nações mais desenvolvidas e que os oprimiam. Conhecer esta história só ajuda aos povos indígenas a saber que não estão sozinhos e que também podem sobreviver. Não posso aceitar a acusação de que trocamos assistência de saúde e educação por conversão, ou de que usamos nossa estrutura de apoio para obrigar os indígenas a se tornarem “prosélitos” do Evangelho. Como muitas afirmei em meu livro Chamado radical, a verdadeira missão cristã não é religiosa. É uma missão de amor. Não somos chamados a nada, a não para amar à custa de nossas próprias vidas.

Quais são os benefícios da presença missionária entre as etnias indígenas brasileiras no que se refere a trabalhos de preservação lingüística e cultural?

São inúmeros os benefícios. Eu poderia falar sobre as reduções jesuítas, que eram os maiores pólos de desenvolvimento do Brasil-Colônia e da contribuição cristã aos direitos humanos e respeito às línguas e culturas indígenas, numa época onde imperava apenas a barbárie, quando o comércio de escravos e o genocídio de povos inteiros eram parte essencial do tecido sócio-econômico. Em 1560, quando os índios eram considerados quase como animais, o padre José de Anchieta publicou a primeira gramática em uma língua brasileira – a Gramática da língua mais falada na Costa Brasileira. Mas, falando apenas no século 20, vamos pensar nas missões indígenas protestantes, ou modernas. O respeitado antropólogo brasileiro Darcy Ribeiro convidou o Summer Institute of Linguistics (SIL), para se estabelecer no Brasil. Parte dos maiores pesquisadores em lingüística descritiva e antropologia cultural do mundo eram membros e líderes daquela entidade, que no Brasil chama-se Sociedade Internacional de Lingüística. Darcy, como o visionário que era, percebeu o impulso que uma organização como a SIL poderia dar ao estudo dos povos brasileiros. Repare que havia já outras missões agindo entre indígenas, como a missão Caiuá, por exemplo, que focalizava a questão da saúde. Mas foi a entrada da SIL que sistematizou a documentação de dados culturais e lingüísticos dos povos indígenas de todo o Brasil. Ainda hoje, o acervo científico da SIL é maior do que o de qualquer universidade brasileira. Por muitos anos, os únicos a levarem educação chamada bilíngüe e bicultural, que usa como base a língua materna e treina professores indígenas, foram as missões protestantes. Apesar da Lei de Diretrizes e Bases da Educação prever a obrigatoriadade do uso da língua tribal na educação indígena, os municípios não têm pessoal técnico para fazer isso. Já as missões não só têm recursos humanos, mas possuem documentação lingüística, experiência e a confiança das populações indígenas para possibilitar a aplicação da lei. Mas, infelizmente, o preconceito e a discriminação contra as missões hoje fazem com que a educação indígena seja descaracterizada e aleijada.

Se missões como a Jocum alcançaram tanta excelência nos estudos lingüísticos e culturais, porque as organizações não-governamentais leigas são mais prestigiadas pelo governo e a opinião pública em geral?

As ONGs indigenistas militam sempre para poder manter seu controle, e contra as missões. O domínio da questão indígena por concepções tacanhas e estranhas ao interesse real dos povos indígenas tem que acabar. Nosso pessoal, que é brasileiro, tem sido retirado das áreas indígenas e impedido de atuar como tradutores, apesar de mais de duas décadas de experiência com as línguas nativas. Contudo, temos informação de que um alemão entrou em nosso lugar. Não sabemos o que ele faz lá, mas vai ter que começar do zero. Estranho, não?

Muito se fala numa suposta interferência do Evangelho sobre o ethos tribal. Afinal, a pregação da fé cristã pode representar um risco ao modo de ser do indígena?

Narro em meu livro a história de um índio suruwahá, pajé, que teve uma visão de Jesus no caminho. Ele viu Jesus numa das trilhas da mata, totalmente caracterizado de índio suruwahá, nu, pintado de vermelho usando cordão peniano. Ninguém contou pra ele como Jesus se vestia ou que jeito tinha. O Evangelho traz aos homens uma revelação supracultural. De acordo com o antropólogo Don Richardson, 100% das culturas do mundo têm o conceito de um Deus Criador como parte de sua cosmovisão. Para as culturas brasileiras, em geral, dizer que existe um Deus Criador não é introduzir um conceito novo, mas é afirmar uma parte essencial da religião tribal. Todas elas têm o nome para o Criador e algumas até para seu filho, que muitas vezes é o principal herói mítico. O que o Evangelho traz de novo é a participação de um espírito bom (Jesus) e que tem poder sobre os maus, a salvação individual e as conseqüências desta salvação – ou seja, a revelação geral já está presente. O que levamos são apenas detalhes; não existe rompimento com o núcleo cosmológico. O secularismo, no entanto, que chega através de tantos outros meios, inclusive a própria escola, confronta diretamente o universo tribal, relegando todas suas crenças fundamentais à categoria de mitologia.


Leia também a entrevista sobre esse mesmo assunto com Edward Gomes da Luz da Missão Novas Tribos do Brasil: http://www.cristianismohoje.com.br/artigo.php?artigoid

Fonte: Veredas Missionarias